“Os jovens, principalmente os adolescentes, estão cada vez mais expostos a ruídos de alta intensidade”, é o que diz a Valéria Gomes, fonoaudióloga do Ceol. Sobre o assunto, ela escreveu o livro Alterações Auditivas Precoces Juvenis. Mito ou realidade?, com co-autoria de André Luiz Lopes Sampaio. A obra vale a pena ser lida com atenção por quem tem interesse pela saúde dos adolescentes ou convive com eles.
Segue o resumo do livro:
Os jovens, principalmente os adolescentes, estão cada vez mais expostos a ruídos de alta intensidade, entre eles se destaca a música. Determinados ambientes e mesmo os fones de ouvidos podem atingir níveis de pressão sonora elevados, capazes de lesionar o aparelho auditivo, mais precisamente as células do ouvido interno.
O trabalho desenvolvido nesta pesquisa teve como objetivo investigar a prevalência de lesão dessas células em uma amostra de estudantes de uma escola privada do Distrito Federal utilizando os testes de emissões otoacústicas. Simultaneamente os indivíduos foram investigados sobre o uso de fones de ouvido e quanto à frequência a lugares com música amplificada.
Os resultados foram surpreendentes pois, observou-se que, a grande maioria dos participantes apresentaram alterações nos exames realizados. Do total de jovens que fizeram parte deste estudo, um número significante (80%) apresentou sinais de comprometimento de células cocleares. Isso poderia indicar precocemente uma disfunção coclear e, pelo alto número de participantes que relataram se expor à música alta, há suspeita de que esse hábito pode estar influenciando nessas alterações cocleares.
A PAIR – perda Auditiva Induzida por Ruído é um problema invisível, que pode estar sendo ignorado pela população jovem quando se trata da música de alta intensidade, e poderia ser erradicado com o apoio das escolas e de educação.
A porcentagem de alterações auditivas entre jovens do ensino médio aumentou 2,8 vezes nas últimas décadas segundo estudo realizado nos Estados Unidos; já no Brasil, não há estudos que mostrem mudanças nos limiares auditivos nesta população. Esse fato nos faz refletir sobre a necessidade de investir em estudos nessa área e de campanhas informativas. Os jovens deveriam ser informados sobre o risco para a audição quando são submetidos à exposição a músicas de alta intensidade, seja por meio do uso de fones ou em atividades de lazer que envolvam música alta.
Poucos são os programas preventivos de perda auditiva consistentemente implementados em locais onde se concentra o maior números de adolescentes, como em escolas por exemplo. No Brasil, existem campanhas cujo objetivo é a promoção da saúde auditiva, como “O Dia Internacional de Conscientização dos Efeitos do Ruído” e também o “Passe Adiante Esta Ideia”. Contudo, ainda não são suficientes para trabalhar a conscientização da população jovem.
Uma sugestão seria a de implementar programas que incentivem a mudança de hábitos em relação à música amplificada desde a fase infantil. As escolas poderiam adotar para seus currículos questões que abordassem hábitos auditivos saudáveis, uso de protetores auditivos e os efeitos da exposição à música de alta intensidade sobre a audição, desde as séries mais iniciais. Também podem-se adotar formas de monitoramento auditivocom solicitações de exames periódicos anuais, como um trabalho de prevenção da saúde auditiva e de melhoria da qualidade de vida desses jovens.
É possível que os altos percentuais de exames negativos encontrados neste estudo seja devido á alta percentagem de estudantes expostos a fones de ouvido e a música amplificada.
Diante dos resultados encontrados nesta pesquisa, e partindo do princípio que, problemas auditivos representam um sério obstáculo no processo de ensino-aprendizagem, nasce a preocupação e desperta a necessidade de desenvolver um trabalho educativo e preventivo quanto a saúde auditiva para esse grupo de pessoas tão jovens. O ministério da saúde em parceria com a ministério da educação, criaram a campanha “Quem Ouve Bem, Aprende Melhor!”, instituída por meio da Portaria Interministerial MEC/MS Nº 1.487, de 15 de outubro de 1999, publicada no Diário Oficial Nº 199-E, de 18 de outubro de 1999 que conta ainda com o apoio da Sociedade Brasileira de Otorrinolaringologia e Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia.
Esta campanha se propôs a desenvolver um programa de caráter preventivo, com objetivo de identificar alunos com déficit na audição e intervir com orientações aos responsáveis e escola, seguido de acompanhamento para tratamento adequado. Porém esta campanha foi lançada apenas para a rede de ensino público fundamental. Mas diante da problemática exposta neste trabalho, essa conduta poderia ser revista a fim de abranger todas as redes de ensino, não só pública como também as redes de ensino privada, incluindo também o ensino médio.
Outra forma de trabalhar a prevenção seria incluir na rotina médica, a solicitação de exames auditivos por pediatras e otorrinolaringologistas em clinicas e hospitais a fim de monitorar a saúde auditiva dessa população.
Existe no Brasil o Programa Saúde na Escola, instituído por meio do Decreto Presidencial nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007, representando uma política intersetorial e de integração entre os Ministérios da Saúde e da Educação. Uma das ações citadas pelo Decreto nº 6.286/2007 é a avaliação da audição, o que corresponde, no âmbito escolar, à triagem auditiva. Essa ação, que deve ser desenvolvida por um fonoaudiólogo, representa uma estratégia relevante ao estudante, uma vez que alterações auditivas trazem consequências para o desenvolvimento global desse aluno, incluindo o processo de aprendizagem.
É por meio da avaliação audiológica que muitas desordens do sistema auditivo são encontradas. Nesse sentido vê-se a importância da criação da triagem auditiva nas escolas e check-up nas clínicas e hospitais avaliando não só a criança, mas também o adolescente sem sintoma aparente. Pois, tais hábitos de exposição à música amplifica podem desenvolver alterações auditivas acarretando prejuízos futuros.
A avaliação auditiva completa envolve exames que investigam a funcionalidade de toda a via auditiva, desde o processo de captação do estímulo sonoro até o seu registro no córtex cerebral. Para esta avaliação precisa, incluem audiometria, imitanciometria, emissões otoacústicas e potenciais auditivos (Bera). Dependendo dos resultados, outros exames como PAC – processamento auditivo central e potencial auditivo P-300 podem complementar o diagnóstico. Cada um desses exames tem aplicações relevantes na prática clínica audiológica e de otorrinolaringologistas.
Sobre a autora: Valéria Gomes da Silva é mestre em Ciências Médicas, graduou-se em Fonoaudiologia pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás, realiza doutorado em Ciências Médicas dela UnB – Universidade de Brasília. Atua na área de audiologia clínica e exerce atividades acadêmicas como docente no curso de Fonoudiologia da UNIPLAN – Centro Universitário Planalto do Distrito Federal.